Lei e graça são viáveis?
Um dos pontos principais que enfocaremos nesta edição se refere a um conceito existente na igreja há centenas e centenas de anos, onde se diz: “estamos debaixo da graça e não debaixo da lei”. Realmente podemos encontrar este versículo na Carta de Paulo aos Romanos (Rm 6:14). Mas, este versículo tem sido interpretado erroneamente pelos pais da Igreja de Roma, o qual vem perpetuando no meio cristão até nos dias de hoje. Alguns crêem, por incrível que pareça, que o Antigo Testamento é um livro de lendas e história de Israel. O pior é que muitos usam ou citam este versículo como se fosse um “passaporte” para o crente fazer quase tudo o que deseja. Agem como se a graça de Jesus abrisse todas as portas quanto aos “antigos” mandamentos, estatutos ou ordenanças dados por Deus. Pensamentos como, se estamos debaixo da graça não há fronteiras ou limites que nos cercam. Como por exemplo, pode-se comer tudo o que se deseja de modo irrestrito; tem-se sempre o pronto perdão de Deus para as falhas e pecados, não gerando conseqüências para aquele que crê. Afinal, podemos trabalhar o tanto, como e quando quisermos, relacionar com quem quisermos, comer com quem quisermos, sentar com quem quisermos, participar e se envolver intensivamente na sociedade e com as coisas mundanas, relacionar intimamente com a esposa de modo irrestrito, criar filhos e educá-los sem os impor limites e punições, enfim, estamos na graça e “livres” de qualquer lei que nos oprime, incomoda ou nos aborrece. Lei é para os desobedientes judeus ou para aqueles que buscam para si um peso ou um neurótico estilo de vida, dizem alguns cristãos. Afinal, “Estamos ou não debaixo da graça e não debaixo da lei”? Será que Paulo anulou a lei que Jesus não aboliu ( Mt 5:17) quando citou este versículo? Não é difícil perceber que o contexto que Paulo aqui se refere, como judeu zeloso e cumpridor da lei ( At 25:8;28:17),
não é que a graça de ser salvo anulou a lei, mas sim, aquele que teve a experiência do novo nascimento em Cristo, ou seja, a natureza do pecado que habitava em nós deu lugar ao Espírito de Deus, não estando mais sob o jugo da lei do pecado ( natureza do pecado), que oprime, amarra e destrói o homem, o separando de Deus. Uma coisa é entender o legalismo da lei a outra é viver sob os princípios da lei. Se este versículo continua sendo entendido erroneamente pelos cristãos, então, é melhor que estes cristãos risquem todas as cartas de Paulo, os escritos dos profetas e toda a Torá de suas Bíblias, pois, encontramos nas Escrituras os inefáveis benefícios da lei, a qual o próprio Paulo como salvo em Yeshua (Jesus) se refere a ela chamando-a de santa, justa e boa e que nela se encontra prazer (Rm 7:12;22); Ele disse isto não só porque ele era um judeu zeloso, mas sobretudo, porque os gentios também deviam ter consciência que a lei é santa, justa e boa, como escrito no verso 12 da sua carta endereçada aos Romanos. Agora, um judeu não messiânico ou qualquer pessoa fora da graça salvadora que só guarda a lei, ou parte da lei, desprezando ou desconhecendo a graça, não estaria cumprindo o pleno propósito de Deus. Aqui está o erro: - parar na lei e desconhecer Jesus, a maior graça de Deus. Devemos, então, abolir frases como “não temos nenhum compromisso com a lei”, “Cristo nos resgatou dessa maldição ou a lei é para judeus e a graça de Deus é para os crentes” ou ainda “ o fim da lei é Cristo” no sentido que Ele terminou com a lei, etc. são conceitos mal interpretados que irão cada dia mais afastar a Igreja do verdadeiro propósito, distanciando-a ainda mais de suas raízes bíblicas e judaicas e, principalmente, de Israel e de seu povo que ainda precisam ser salvos, reconhecendo Yeshua como o seu esperado Messias.
Em II Tm 3: 16,17 lemos: “Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça...”. Ora, que Escritura é esta a que Paulo se refere? Naquela época não existia ainda o que se chama de Novo Testamento. Assim, a expressão “Toda Escritura” se refere obviamente ao Antigo Testamento, ou seja, a Torá (o Pentateuco de Moisés), os profetas (Niviim) e os santos Escritos (Ketuvim). Este conjunto de livros é chamado pelos rabinos de Tanach ( ou Tanak) que é um acróstico formado pela abreviação das primeiras letras das palavras Torá, Niviim e Ketuvim. Há um mal costume dos primórdios da Igreja de chamar a Tanach de Velho ou Antigo Testamento, dando a entender que existe um novo e que o velho se tornou fora de uso ou obsoleto. Mas, sabemos que isto não é verdadeiro, pois o que Deus inspirou é santo, bom, justo, fiel e válido para hoje e para sempre.
Mas, o que é então a graça de Deus?
Esta palavra no hebraico é “Hessed” ( dsj ), pode também ser traduzida como o amor de Deus, a misericórida e até mesmo pelo perdão de Deus. A palavra graça no conceito hebraico ainda inclui o conceito de perdão de uma dívida, onde o credor usa de uma graça para abater parte de uma dívida. Por exemplo, se uma pessoa deve R$100 a alguém e este resolve perdoar R$80,00, a dívida passa a ser somente de R$20,00. A parcela perdoada é que se chama de “graça”.
Qual seria, então, a maior graça de Deus? A maior graça é crer em Yeshua como filho de Deus, ser salvo e alcançar a vida eterna através Dele. Ou seja, Deus enviou seu Filho como graça para quitar nossa dívida. Mas, o fato de ser salvo pela fé no sangue de Yeshua que me purifica de todos o meu pecado não torna a lei inválida. Pois, se eu nego a lei, estou negando o pecado. Não é a transgressão da lei o pecado? Se eu nego o pecado, eu nego a morte e como conseqüência a necessidade da morte de Yeshua que traz vida, e vida em abundância.
O próprio Yeshua disse em Mt. 5:17 – “ não pensais que vim revogar a lei ou os profetas, não vim para revogar, vim para cumprir”. Se ele tivesse anulado a lei estaria negando a si mesmo.
Muitos cristãos também acham que a graça foi inventada no Novo Testamento. Mas, esta palavra, Hessed (graça) já aparece nos primeiros livros da bíblia. Não seria, por exemplo, a criação do homem a manifestação da graça de Deus? O cuidado na preparação de um lugar para colocar o homem, criar o sol, as estrelas, os astros para enfeitarem a sua noite, não seria a manifestação de sua graça? Quando o homem caiu em Gn.2:15 vemos a manifestação da graça de Deus ao prover, ainda no jardim, a promessa da vitória sobre o mal, através de Yeshua? Tudo o que Deus fez foi pela sua graça, pelo seu amor incondicional.
Se observarmos a natureza em seus mínimos detalhes – as plantas com seus tons variados, o ciclo da natureza, o mover dos astros em suas definidas órbitas – tudo isso não seria a manifestação da graça de Deus? A multiplicação das sementes, os frutos não são todos resultantes da graça de Deus? Quando Deus coloca o homem no jardim e cria para o homem o trabalho (o cultivo do jardim) não é essa manifestação da graça de Deus? Isso é muito bonito e profundo!
É interessante ver no hebraico a palavra usada para designar o trabalho. A palavra “abad” (db[) significando trabalhar (produzir algo) para louvar a Deus. Observe que é o ato de trabalhar deveria ser uma forma agradável de produzir algo, glorificando o Criador de todas as coisas, pois afinal, o homem foi criado para refletir a Sua imagem e semelhança. Mas, pode haver um outra pessoa que trabalha sob pressão ou amaldiçoando ou murmurando. Neste caso, a palavra que se usa na língua hebraica é a mesma grafia, mas com pronúncia diferente. Se diz “ebed” (db[), significando trabalhar sob pressão, trabalho penoso ou trabalho escravo.
Isto nos induz que conceito da graça de Deus nos conduz a sabedoria de viver no livre-arbítrio. As coisas tem propósito neutro, quem define o lado bom ou o lado mau somos nós mesmos.
É maravilhoso ver o que Deus preparou para o homem. Deus queria o homem produzindo algo, criando, transformando idéias e planos em algo real, concreto como uma maneira de adorá-lo.
A graça de Deus sempre atuou em toda a história do povo judeu. Não foi a graça de Deus que livrou os hebreus das pragas do Egito? Quem teria aberto o mar Vermelho se não a graça de Deus? Quem teria feito de um simples pastor chamado David um vitorioso guerreiro que derrotava gigantes? No livro de Salmos vemos em várias passagens que reconhecem a multi-graça de Deus sobre sua vida e de seu povo(Sl. 90:17).
Só se entendemos a graça de Deus derramada no “Antigo” Testamento podemos entender At. 15:11 – “Mas cremos que fomos salvos pela graça de Deus...”. Qual graça? A mesma presente desde a criação do homem. A graça de Deus enviou Seu filho Yeshua, para morrer como pecador, para pagar todos os nossos débitos. Todo aquele que peca é devedor, seu fim é a morte. Mas pela graça de Deus nossos débitos, por falharmos em cumprir Sua lei, são quitados por Yeshua. Isto não significa que a lei não é mais válida. Toda a graça de Deus converge para a pessoa de Yeshua.
Nos parágrafos anteriores relacionamos a palavra graça com a lei e com a palavra trabalho, mas vamos encontrar na bíblia a correlação com a glória de Deus. Em Romanos (3:23,24) diz: – “Pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus”.
A palavra glória no hebraico é “Kevod (dbk) e que significa peso. O peso de Deus é Ele mesmo, sua essência, Seu Espírito. Então, o pecado tira de mim a essência de Deus, e me coloca “pesado de mim mesmo”. Para desfrutar da glória de Deus tenho que despir de minha própria glória. A minha glória, o meu eu, tem que ser colocado no “misbeah” (jbzym), ou seja, no altar, que é lugar de morte da natureza adâmica ou do pecado. No altar de sacrifício é que posso despojar do velho homem e encher-me da essência de Deus. Só aí, então, vou ser cheio da glória de Deus, do Seu conhecimento, recebendo capacitação e direcionamento Dele e, sobretudo, o Seu perdão.
Agora podemos ver algo maravilhoso – apesar de termos sido salvos pela maior graça, que foi o sacrifício de Yeshua, precisamos da lei para nos conduzir, capacitar, orientar, nos ensinar, nos adestrar, nos corrigir. Por quê? Porque Yeshua é a Palavra, o Verbo, a Lei que fala e trata do pecado.
Imaginemos que agora o governo quer dar a graça aos adultos brasileiros de todos possuírem a carteira de habilitação. O fato de possuir a carteira não isenta ninguém de observar as leis de trânsito, não é mesmo? Da mesma forma, uma vez remido pelo sangue de Yeshua e não podemos simplesmente esquecer toda a lei. Ao contrário, a redenção em Yeshua traz a cada um de nós maior peso de responsabilidade na observância da vontade de Deus. Só damos o devido valor a graça se conhecemos a lei e sua conseqüência. Na lei de Moisés era pecado o adultério (Dt. 5:18). Que diz a graça em Yeshua? – “ Se Olhar para uma mulher com uma intenção impura, no coração, já adulterou com ela” (Mt. 5:28). Na graça, o ódio ao irmão é semelhante ao homicídio. Vemos, então, que a graça embora seja recebida e dada pela fé e de graça, nos exige que andemos num nível e numa qualidade de vida muito mais alta que a lei. Mas, a lei é boa, pois ela nos delimita, marcando até onde podemos chegar. Em outras palavras, a lei nos estabelece limites e nos preserva e previne de conseqüências danosas.
Muitos cristãos dos dias atuais passam por cima de muitos mandamentos de Deus, alegando estar debaixo da graça e não sob o jugo da lei. Mas, a lei não foi anulada como foi dito! Imagine que no nosso exemplo didático, as leis de Deus são comparadas como às leis da placas de trânsito que orientam os motoristas. Estas placas (leis) são sinais de alerta de direcionamento e de orientação que nos levam em segurança ao nosso destino final. Temos a graça de dirigir, mas a lei nos conduz para não sairmos da estrada e não errarmos o alvo. Está em Yeshua é estar na graça (no caminho certo), mas agora temos que caminhar pela a estrada do mundo, a aí então é que precisamos da lei. Há uma única maneira de ser salvo: – crer no sacrifício e no sangue de Yeshua. Nada mais que façamos nos reconecta com Deus. Mas a lei existe para nos direcionar em nossa caminhada caminha, nos alertando que devemos guardar e permanecermos na plena graça e misericórdia divina. Na carta de Paulo aos Gálatas ( 3:24) diz que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo. O aio é aquele instrui que direciona. Somente entendendo a lei temos o entendimento do que é a graça. Muitos dos chamados “crentes desviados” estão nessa situação porque não deram a devida importância à graça, que só é possível de conhecermos se atentamos à lei, aos mandamentos, aos estatutos e as ordenanças de Deus. A graça disponível em Yeshua não pode ser usada como um passaporte para o pecado. A liberdade em Yeshua é plena da responsabilidade de obedecer aos mandamentos, estatutos e ordenanças de Deus, que são tipos de lei. Lei é uma palavra genérica na língua hebraica ( Dat - td ).
No Salmo 19:7 a lemos “ A lei do Senhor é perfeita e restaura a alma”. Assim, podemos entender que a lei também existe para as áreas não restauradas de nossa alma. O salmista diz: “Agrada-me fazer a tua vontade, o Deus meu; a tua lei está dentro do meu coração.” A vontade de Deus está expressa na sua palavra.
A lei é muito mais prática do que pensamos, como por exemplo, ela lida com problemas comuns,como: a quem emprestar dinheiro, como indenizar alguém por algum dano causado, como preservar o direito de propriedade, como proteger a vida, a saúde, o patrimônio, o sucesso, a maneira de pensar, de se relacionar com o próximo, etc. Um outro bom exemplo é entender a lei judaica do dízimo. É ela uma lei para os judeus? Sim. Ela está citada como estatuto no Antigo ou no Novo testamento? No antigo Testamento. E por que, então, a igreja de hoje pratica a lei do dízimo se é uma lei do Antigo Testamento? É porque dízimo é uma benção, se dou dízimo, reconhecendo que Deus é quem tudo me dá, sou abençoado com a prosperidade, sendo bem sucedido naquilo que fazemos. Nesta lei encontramos o princípio da semeadura e da colheita. Se dou, recebo muito mais. Temos que ser francos ao afirmar que não é sensato só escolhermos aquilo que nos agrada no Antigo Testamento e anularmos as outras ordenanças e estatutos. Se entendemos o dízimo como benção, por que não observamos e buscamos outras leis que abençoam nossa saúde, nossa vida familiar, nossa vida profissional, sentimental, o relacionamento com nosso próximo e tantas e tantas outras leis que foram criadas com o propósito de nos abençoar? Os crentes não devem se esquecer que em Cristo foram enxertados na Oliveira que é o Israel salvo de Deus. Assim, como enxertados eles podem livremente participar de todas as bênçãos e promessas dadas por Deus ao povo de Israel. Paulo diz que os gentios podem participar da mesma seiva da oliveira ( Rm 11;17)
Paulo diz claramente em sua carta aos Romanos evidentemente para os crentes romanos: ...”De modo que a lei é santa, e o mandamento é justo e bom...”( Rm 7:12)
No livro de Provérbios está escrito: “ Filho meu, atenta para as minhas palavras, aos meus ensinamentos inclina os ouvidos, não os deixe aparta-se dos teus olhos, guarda-os no mais íntimo do teu coração, porque são vida para quem os acha e saúde, para o corpo”.(Pv 4:20-22). Onde estão os ensinamentos e as palavras ditas no livro de Provérbios? Na lei. A lei nos traz saúde para nosso corpo. Ela nos ensina a controlar, por exemplo, a alimentação para nos dar melhor qualidade de vida, como já dito anteriormente.
Pv. 28:7 diz: “O que guarda a lei é filho prudente, mas o companheiro de libertinos (comilões) envergonha a seu pai.” É falta de sabedoria comer de modo desenfreado. Pv. 29:18b : “ o que guarda a lei é bem aventurado”. Se sigo o que D’us ordena sou muito mais que feliz e preservo ainda mais a graça de crer em Yeshua.
Tudo isto com um objetivo claro: tornar o homem perfeito e perfeitamente capacitado para toda boa obra. Esse é o padrão de D’us para nossas vidas.
Pv. 28:9 diz: “o que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até sua oração será abominável”. O atender à palavra de D’us me faz apto a ter oração respondidas.
Percebemos pelo curso dos acontecimentos que a igreja de Yeshua, espalhada pelas diversas denominações, deve voltar para o estudo da Torá que quer dizer instrução, ensino da Palavra, da Lei de D’us.
Evidentemente, dispensamos comentários quanto às leis sacrificiais que o próprio Yeshua cumpriu morrendo na cruz como sacrifício vivo por nós, e também de certas leis circunstanciais ou específicas que valeram somente para aquela época de travessia no deserto, como por exemplo certas regras quanto à higiene, alimentos perecíveis, pois não havia sabonetes e nem geladeiras ou freezers. Mas, as leis morais, éticas, familiares e de qualidade de vida, por exemplo, estão mais do que vivas e válidas para os dias de hoje.
Mais uma vez vamos frisar: a lei em si não salva, a salvação é pela graça, mas a lei me capacita a viver no padrão de Deus, mostrando a todos os limites e delimitações até onde podemos chegar dentro da justiça e misericórdia de Deus.
Agora que já sabemos um pouquinho sobre a Graça e Lei de Deus, podemos dizer, A graça sem lei não ficaria sem graça?
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